Milton Nascimento processa Cruzeiro por uso não autorizado de 'Clube da Esquina nº 2'


Quando Milton Nascimento, cantor e compositor brasileiro, juntou-se à gravadora Sony Music e aos seus antigos parceiros do Lô Borges e Márcio Borges, entrou na justiça contra o Cruzeiro Esporte Clube. O motivo: o clube usou, sem autorização, a canção "Clube da Esquina nº 2" em um vídeo que anunciava a contratação do atacante Gabigol no primeiro dia de 2025. A ação, movida na 1ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, pede R$ 50 mil por danos materiais e morais.

Contexto da música e do Clube da Esquina

Formado no final da década de 1960, o Clube da Esquina foi um coletivo que misturou bossa nova, jazz e influências regionais mineiras, criando um dos maiores legados da música brasileira. "Clube da Esquina nº 2", composta por Nascimento, Lô e Márcio, tornou‑se um hino informal para os torcedores do Cruzeiro, já que o clube tem raízes em Minas Gerais.

O uso da melodia, porém, vai além do sentimentalismo. Segundo a Lei de Direitos Autorais (Lei 9.610/1998), qualquer reprodução ou divulgação de obra musical em campanha publicitária exige prévia autorização do titular dos direitos.

Detalhes da ação judicial

O processo, protocolado em 29 de janeiro de 2025, descreve que o vídeo de anúncio – divulgado às 5h da manhã do dia 1º de janeiro – foi produzido internamente pelo departamento de marketing do clube e veiculado nas redes sociais e nos telões do estádio.

  • Valor pleiteado: R$ 50.000,00 em reparação por uso indevido.
  • Base legal: artigos 29 e 30 da Lei 9.610/1998, que tratam de utilização para fins lucrativos sem licença.
  • Tentativas de acordo: duas mensagens enviadas por e‑mail em dezembro de 2024 e uma ligação em 15 de janeiro de 2025, todas sem resposta.

Os advogados de Nascimento alegam que a falta de diálogo demonstra “desprezo pela propriedade intelectual”, reforçando a ideia de que clubes de futebol, ao se tornarem empresas, precisam respeitar regras de mercado como qualquer outra organização.

Reação de Milton Nascimento e da imprensa

O caso ganhou destaque graças à coluna de Anselmo Gois, do jornal "O Globo", publicada em 2 de agosto. No mesmo dia, a equipe de comunicação de Nascimento recebeu uma onda de mensagens de ódio nas redes sociais, o que motivou a publicação de um comunicado oficial em 3 de agosto no Instagram do cantor.

Na declaração, o artista enfatizou que "música é trabalho, é sustento, é propriedade intelectual". Ele comparou o direito à remuneração de compositores ao dos jogadores de futebol, apontando que ambos são profissionais que merecem remuneração justa por uso de sua obra.

Posição do Cruzeiro e implicações comerciais

Pedro Lourenço, acionista‑majoritário da Sociedade Anônima do Futebol (SAF) do Cruzeiro, ainda não se pronunciou publicamente. Fontes próximas ao clube dizem que a diretoria está avaliando se deve apresentar defesa baseada em "uso justo" ou tentar um acordo extrajudicial.

O caso vem num momento em que o Cruzeiro tenta se reposicionar financeiramente após a crise que levou à troca de sua gestão para modelo de empresa‑clube. A contratação de Gabigol, anunciada como parte da estratégia de retorno à elite, tem um custo estimado de R$ 30 milhões, reforçando a necessidade de campanhas de marketing eficazes – mas também o risco de infringir direitos alheios.

Análise de especialistas em direito autoral

Análise de especialistas em direito autoral

De acordo com a professora de direito da UFRJ, Drª Claudia Tavares, "o uso de obra musical em vídeo promocional caracteriza exploração econômica e, portanto, exige licença explícita do titular". Ela acrescenta que, embora o clube possa argumentar que a música foi usada como "trilha sonora" e não como peça central, a jurisprudência recente tende a proteger o autor em situações semelhantes.

Já o advogado especializado em entretenimento, Rafael Silveira, aponta que o valor da indenização pode ser apenas o ponto de partida. "Se o juiz entender que houve dano moral, a quantia pode ser multiplicada e ainda incluir juros e correção monetária", alerta.

Próximos passos e possíveis desdobramentos

O processo tem audiência marcada para 15 de outubro de 2025. Caso o juiz conceda a liminar, o Cruzeiro poderá ser obrigado a retirar o vídeo imediatamente e a pagar a multa. Se a decisão for favorável ao clube, pode abrir precedente para que outras equipes usem obras sem licença, desde que argumentem “uso institucional”.

Independentemente do resultado, o caso reforça a importância de clubes de futebol estruturarem departamentos de compliance que incluam consultoria jurídica antes de lançar campanhas publicitárias.

Key Facts

  • Autor da ação: Milton Nascimento, Sony Music, Lô Borges e Márcio Borges.
  • Réu: Cruzeiro Esporte Clube.
  • Obra em disputa: "Clube da Esquina nº 2".
  • Valor da indenização pleiteada: R$ 50.000,00.
  • Data da divulgação não autorizada: 1 de janeiro de 2025.

Frequently Asked Questions

Qual o valor da indenização cobrada pelo processo?

A ação pede R$ 50.000,00 por danos materiais. O pedido também inclui possíveis valores de dano moral, que poderão ser fixados pelo juiz conforme a gravidade da violação.

Por que o uso da música foi considerado ilegal?

De acordo com a Lei 9.610/1998, toda reprodução ou divulgação de obra musical para fins comerciais exige autorização prévia do titular dos direitos. O Cruzeiro utilizou a canção em um vídeo promocional sem firmar contrato ou pagar qualquer taxa, configurando uso não licenciado.

Como o Cruzeiro pode responder ao processo?

A defesa pode alegar "uso justo" ou tentar um acordo extrajudicial pagando uma licença retroativa. Também pode contestar o valor da indenização, argumentando que o vídeo não gerou lucro direto e que a música funciona apenas como trilha sonora.

Qual impacto esse caso pode ter para outras equipes esportivas?

Se o juiz decidir a favor dos autores, clubes de todo o país precisarão rever suas políticas de uso de conteúdo protegido, investindo mais em licenças e consultoria jurídica. Isso pode elevar custos de marketing, mas também protegerá os direitos de artistas.

O que a Lei 9.610/1998 determina sobre o uso de obras em publicidade?

A lei estabelece que a reprodução, distribuição ou comunicação pública de obra intelectual, inclusive em propaganda, depende de autorização expressa do autor ou titular de direitos. A violação pode acarretar pagamento de indenização por perdas e danos, além de multas previstas nos artigos 61 a 64.

Comentários (4)

  • José Carlos Melegario Soares
    José Carlos Melegario Soares

    É um ultraje ver um clube do tamanho do Cruzeiro se achar acima da lei. O uso de “Clube da Esquina nº 2” foi feito sem nenhum acordo, violando a Lei 9.610. Milton Nascimento tem todo o direito de cobrar R$ 50 mil por dano material e moral. Isso manda um recado claro: direitos autorais não são brincadeira.

  • Leila Oliveira
    Leila Oliveira

    Saúdo a postura firme de Milton Nascimento ao defender a sua obra. A música, assim como o trabalho dos atletas, merece remuneração justa e reconhecimento. É essencial que instituições esportivas adotem políticas de compliance para evitar tais incidentes. Espero que o caso sirva de exemplo para o setor. Que a justiça prevaleça.

  • luciano trapanese
    luciano trapanese

    Galera, o tema aqui mostra como o marketing pode ser muito mais responsável se envolver a equipe jurídica desde o briefing. Não é só sobre ganhar torcida, mas sobre respeitar quem cria a trilha sonora da nossa cultura. Quando o clube perde a oportunidade de licenciar, ele perde credibilidade. Vamos usar esse caso como aula prática para futuros projetos.

  • Yasmin Melo Soares
    Yasmin Melo Soares

    Claro, porque vai ser tão fácil fingir que nada aconteceu.

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